terça-feira, 10 de fevereiro de 2009

Caos coletivo no Transporte coletivo

Caos coletivo no Transporte coletivo

... histórias chegando até seus ouvidos, as escuta, não por curiosidade mas por ser tão concentrado em ouvir os outros, variadas vozes invadem sua boa audição, vozes gulturais, outras esganiçadas, outras com boa dicção; sorrisos, lamentos, pessoas revelando a si mesmas em seus tons de voz. Ali sentado continua, conversando consigo, um colóquio mental. Mas ainda ouvindo.

- Ela é só o filé... aí deixei ela em casa.
...
- Mas rapaz, e porque voçê não mandou ele ir pra china!? Ah! Se fosse eu!
...
- Não tem troco.
- Que empresa lascada é essa que não tem troco pra vinte!?
...

Todos esses capítulos de um livro vivo lhe chegavam, lia-os com atenção, interpretava-os a sua maneira. A janela lhe revelava o mundo exterior, ruas esburacadas, canteiros cheios de lixo, carros novos, carros velhos, uma carroça e seu burro a puxa-la e um burro maior a chicotear o burro; catador de lixo, mendigos, crianças pedindo e janelas ‘fumê’ subindo, muros altos eletricamente protegidos (ilusória segurança), postes com sua iluminação mercúrea, fios abarrotados de ‘raias’ (férias escolares). Uma podridão irrompe pela janela (canal à céu aberto). Eis então o clímax da história:

- Bora! Passa o dinheiro macho!
- Calma...cal...
- Calma é uma porra, bora trocador! Vou te matar hein, seu bosta!
- Cer...to... pega o din...heiro!
- Dá aqui seu baitola!
...

As portas foram abertas e todos esquecem o que estavam dizendo e saem correndo. Confusão esbarrante. Caos coletivo no transporte coletivo. Permanece quieto aquele que quieto esteve todo o percurso. Ri, não sabe de quê, mas ri. O trocador suando em litros, o motorista à acalma-lo. Sirenes (1 hora depois!). Interrogatório. O trocador dá seu depoimento.
- Tu viu a cara do elemento!? Hein? – Pergunta o Policial.
- Era baixo, moreno, magro, tava com uma camisa branca e um boné róseo. – Responde o Trocador
- Brigado!
A figura paciente sai do ônibus, olha para os policiais que depois de pegarem ‘todas as informações’ partem em busca dos ‘elementos’, ou seja, qualquer sujeito baixo, moreno, magro, com uma camisa branca e um boné. E o sujeito que permaneceu quieto durante todo o acontecido pondera e se aflige apenas com uma coisa:
“-Porra! Vou perder a prova!”. Mas deveria ele ter ponderado: “Quantos sujeitos baixos, morenos, magros e com camisa branca e um boné irão sofrer essa noite o famoso “baculejo” dos policiais?”... Pois ele próprio era um sujeito baixo, moreno e magro...

Nenhum comentário:

Postar um comentário